O que ele enxerga?

Eu não sei. Me perguntam sempre. E não saberemos até ele mesmo nos contar.

Talvez essa seja uma das maiores dificuldades desta jornada, passamos os dias imaginando, supondo, testando. Mas aprendi e bem no começo desta caminhada, que é também aí que mora a incrível beleza de conviver com uma deficiência: eu me emociono com TODOS os detalhes, com TODAS as pequenas percepções, com TODAS as pequenas conquistas. Pra mim nada é pouco, tudo é novo, tudo é conquista.

Uma das primeiras coisas que ouvimos é que não existe nenhum baixa visão igual ao outro, não é uma deficiência que segue padrões, é quase como uma identidade própria do portador.
Há visões bem comprometidas, outras nem tanto, mais tubolares, mais periféricas….
Aqui dois termos passam a fazer parte da sua vida:

  1. Resíduo visual: é o que existe de visão, o que sobrou no momento da perda. A estimulação visual serve para ensinar e auxiliar o deficiente a utilizar esse resíduo da melhor maneira possível, para que tenha qualidade em mobilidade, atividades básicas do dia a dia,  ler e escrever etc.
  2. Acuidade visual: ou simplesmente a sigla AV, é a aptidão do olho para distinguir os detalhes espaciais. É a capacidade de identificar a forma e o contorno dos objetos.
    A acuidade visual pode ser medida mostrando-se objetos de tamanhos diferentes ao paciente e que se encontram a uma mesma distância do olho. A forma mais correta para medir a acuidade é no consultório oftalmológico, e utiliza-se, normalmente, a “Tabela de Snellen” (ainda estou aprendendo sobre isso, acho um pouco complexo, mas é essa tabela que define  em números absolutos a % de visão).
    Ainda não podemos fazer isso, pois Miguel é muito pequeno e não tem nível suficiente de concentração e interação.

*Pessoas com, por exemplo, Miopias, que ao utilizar óculos ou lentes de contato veem nitidamente, NÃO TÊM BAIXA VISÃO. A baixa acuidade visual ocorre quando o nível de visão, mesmo com a melhor correção óptica permanece inferior ao considerado “normal”.

Nossas percepções:
Não se ganha visão, mas se desenvolve habilidades com o que se tem. O fato é que talvez, no fundo do meu coração, eu discorde disso.
No começo de tudo Miguel nem piscava, não percebia nada vindo em sua direção. Hoje faz coisas incríveis. Já sentimos bastante dificuldade em perceber coisas de perto, quase sempre de longe (e sinto isso melhorando muito), muitas vezes é difícil distinguir rostos e evidente é: não consegue fixar o olhar por mais de 5 segundos, tem mais visão no olho esquerdo do que direito, aproxima os objetos bem próximo dos olhos para compreender detalhes, há um estrabismo em progressão principalmente no olho direito (e é isso que temos nos concentrado em corrigir nesse momento) – há um fato interessante  e preocupante aqui. Se há um olho que “enxerga” mais que o outro e isso duplica imagens ou prejudica a nitidez e noção de profundidade de alguma forma, naturalmente o nosso cérebro entende que deve “desligar” o olho não bom e nesse caso se perde a visão deste olho. É preciso trabalhar principalmente com tampões para estimular que os dois olhos trabalhem sozinhos.

Tenho procurado “experimentar” o que o Miguel sente.
Me emocionei na primeira que coloquei um tampão. Isso é ruim, incômodo, dói na pele, prejudica a noção de profundidade, a estabilidade e segurança. Mas força ao máximo a necessidade de concentração e foco, algo que temos que trabalhar muito. Ser mãe de um baixa visão é também uma lição diária de auto controle. Qdo coloquei o tampão me desesperei, comecei a chorar e pensar “meu deus meu deus q difícil é pro Miguel enxergar” e fiz toda aquela projeção de um futuro sombrio. Mas, o que ele enxerga? O que enxergará? Só no futuro ele nos dirá. Até lá a gente vai tentando adivinhar e o ajudando a driblar toda e qualquer dificuldade.

Mamãe com tampão no olho

Hoje testei algumas possibilidades, podes clicar em cima pra ver.

Um toque vale mais do que mil olhares <3

No nosso caso: Um toque vale mais do que mil olhares . Miguel fazendo cuca com a mamãe no dia do seu batizado. ——– Experimente vendar os olhos e fazer a atividade mais básica como escovar os dentes, por exemplo. Coloque -se no lugar no outro, exercite sua compaixão. Vais ter uns 100 anos de evolução espiritual a frente.

 

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